O professor e consultor em
comunicação Júlio Barbosa foi o entrevistado da Live Pro Comunica desta quinta,
dia 25 de junho, e falou sobre as novas mídias da comunicação das marcas na
pandemia e por onde as pessoas estão se informando e consumindo. Mais que uma live, foi uma aula, na opinião de
uma das participantes!
A mentora do Coletivo Pro Comunica
Claudia Cezaro Zanuso quis saber se a comunicação já mudou neste momento. “Logo
no começo, houve o mundo dos excessos – lives, podcasts, divulgação – sem
planejamento, tudo muito jogado. Num segundo momento, as organizações quiseram
investir nesse processo de lives e influencers para vender. Agora, caminhamos
para uma terceira onda, a partir de agosto, em que haverá mais calma, com
estratégias mais trabalhadas. O ponto fundamental é autenticidade.”
Como exemplo, lembrou as duas lives feitas por Ivete Sangalo. “A
primeira, em casa, com a família por perto, explodiu em audiência. As pessoas
se conectaram com a verdade. A segunda foi programada, roteirizada, pronta; e
não funcionou.”
“As organizações que vão se diferenciar são as que propuserem elementos
simples, mas autênticos.” Para Júlio, “a sacada da internet é propiciar autenticidade
e, no distanciamento, queremos ver algo que nos conecte com as emoções”.
O que é
ser autêntico?
“Vou explicar desta forma: a diferença entre influencer e opinion maker.
O influencer trabalha com elementos voláteis, com o factual, com o instintivo,
com o passageiro. Vamos ter agora um declínio do influencer e um crescimento do
formador de opinião, que trabalha a perenidade das intenções e das ideias e a
autenticidade dos sentimentos. Vamos ter uma nova era de ideias e conceitos,
menos superficial. Quero alguém que fale de moda, com um mínimo de informação
de moda. Aí começa a mudança do que serão esses processos de venda e consumo
pela internet. A escolha será outra.”
Isso é
efeito do isolamento ou uma nova era que viria mesmo?
“A Covid antecipou isso. Enquanto circulávamos por aí, não havia tanto
efeito. Agora, estamos com concentração em redes sociais. Mais gente passou a
usar essas redes e os que usavam passaram por um processo de mais intensidade. Há
novos usuários, que querem participar do processo e querem qualidade. Quem
entrou no mundo digital não foi o shopper, foi o comprador.”
A gente passeia pelo digital, como se passeasse pelas lojas. Procuramos
em sites, esperamos promoções. Há uma mudança no consumo. “Estamos mais
criteriosos.”
Júlio citou o antropólogo Edgar Morin, para quem a complexidade é o que é
tecido ou forjado em conjunto. “Estamos no período histórico mais complexo da
humanidade de fazer exatamente isso. É a ordem e a desordem, todo dia em tempo
integral. Estamos vivendo a contemporaneidade, que tem como base coerência e
contradição. Temos três elementos juntos: ética, solidariedade e incerteza. Por
isso, a dificuldade de escolher os meios, dar a informação e atingir o público
com eficácia.”
Em relação a lives de comportamento, não existe mais o certo ou a
receita, é tudo experimentação. E como fica a marca? “Primeiro, falemos do posicionamento
das lideranças com as marcas – elas estão aprendendo nesse processo, a maioria das
marcas ainda está perdida. Elas estão dizendo que estão vivas e apoiando a
sociedade, ou seja, é uma presença institucional. Precisa haver mudança nas
lideranças, com a preocupação social e econômica também.”
“As marcas precisam ser mais ágeis. A tecnologia passa por um problema
sério que é a segurança de dados. Antes de se expor totalmente, as marcas
precisam tratar estes dois assuntos: a agilidade da entrega e a confiabilidade
da sua tecnologia. Há uma desconfiança geral. Magazine Luiza saiu na frente no
uso da inteligência artificial, mas não quer dizer que esteja mais adiantada.
Já estava apostando nisso. Está começando o processo.”
“As marcas pequenas estão sofrendo porque muitos não acreditaram na
internet. E a economia nos obrigará a uma mudança mais profunda. As marcas têm
que trabalhar a escala do volume e não da unidade. O melhor é produzir muito
mais e gerar lucro menor, ganhando na escala com preço mais adequado. Os canais
digitais vão facilitar a venda em escala, mas isso exige logística de entrega
muito em estruturada.”
O novo processo de
consumo
É natural que as lojas físicas diminuam e as virtuais cresçam? “A gente
vai ter equilibro entre físico e digital. Vamos voltar a um processo de um ciclo
da necessidade. Vou comprar o que preciso. A consciência de si e do outro vai
nos levar a uma mudança no hábito de consumo.”
Júlio destacou que as marcas terão de considerar isso, o que preocupa as organizações,
porque elas viram que o consumidor está mais exigente. “Antes de consumir,
penso se preciso disso. Não é geral, claro. Tem gente indo à praia ou ao baile
funk. Mas uma boa maioria está começando um novo processo de consumo. Isso vai
mudar a forma como a inteligência artificial trabalhará os novos processos.”
“Quero agora uma marca que me dê muito mais do que um produto, que tenha
uma proposta de valor muito maior. E não será um simples influencer a fazer
isso. Quero escutar alguém que me diga alguma coisa, que me conecte com os
sentimentos e traga mais profundidade.”
Marca não só vende, mas também informa? “É a construção de
relacionamento. Passamos a um modelo de existência diferenciado, este é só um
pontapé inicial da mudança. Aqui se planta uma semente de uma nova concepção de
sociedade, que não vai mudar de um dia para a noite, mas porque foi obrigada a
mudar. Teremos mais pandemia daqui para a frente, mais problemas coletivos e
teremos ainda uma segmentação de mercado, nichos de mercado.”
Como
atrair a atenção do cliente?
“Temos que pensar nas novas tendências. Uma delas são as narrativas
identitárias. Quando tenho uma narrativa que comove, que tem razão de ser, esse
cliente vai vir naturalmente, porque ele está no mundo online. Ele quer se
identificar com algo que faça sentido para ele. Numa loja, às vezes, você compra
o produto porque o vendedor emocionou você. No mundo online, precisamos de
humanidade. Gente que gosta de gente também gosta de gente online.”
“As marcas vão ter que redescobrir seus funcionários, seus consumidores.
Vão ter que trazer o consumidor para dentro da fábrica. Lembremos Vera
Giangrande, que reergueu o Pão de Açúcar. Como ombudsman, ela criou, nos anos
1990, o grupo das donas de casa e ia com elas ao supermercado.”
O consumidor poderá participar da vida das empresas. “A empresa não será uma
provedora de produtos, mas uma construtora de relacionamentos.”
Consumo porque
confio, então?
“A relação até agora era muito superficial. Bastava
a promoção e se comprava de empresas racistas, preconceituosas, escravocratas, com
trabalho infantil... Agora, temos que pensar nas três fontes de poder das
organizações: propriedade, autoridade (para produzir algo) e uso da
personalidade de influencers para vender. Isso vai ter que acabar. Num processo
em que o quarto poder é a autenticidade, não posso usar uma personalidade que promova
minha marca e esteja atrelada a coisas que não fazem mais sentido.”
E o produtor local, o
pequeno negócio. São importantes, não é mesmo?
“É uma verdade que acontece em outros países e tem
que acontecer aqui. Em muitos lugares existe respeito ao produtor e ao comércio
local, que empregam mão de obra. É hora de valorizar os pequenos produtores e
lojistas. Mas eles precisam aprender a trabalhar com escala.”
Outra questão importante é a boa comunicação no
atendimento. Informação no mundo da inteligência artificial é um problema.
Quando se faz um site, um Instagram, um Facebook, é preciso pensar no processo
de compra. Que informações estão lá? Na hora de finalizar a compra, no
carrinho, percebo dificuldade de obter resposta, ajuda ou orientação. As marcas
precisam fazer a lição de casa do ponto de vista da segurança e da qualidade da
informação. Erros são inaceitáveis.”
”Por exemplo, a Amazon inova quando faz da loja
física um ponto de encontro e um espaço de cultura. Eu estou em contato com a
empresa e encantado com o nível de resposta, a agilidade na interação. A Amazon
está num bom caminho. A grande sacada é a liderança que aprende, o que é fundamental.”
Para encerrar, dicas de ouro:
· Simplificar os meios digitais utilizados, pois eles
estão ficando superlotados
· Simplificar o processo de venda – o consumidor quer
qualidade/segurança de informação e autenticidade
· Usar mais os funcionários na comunicação e na
humanização do processo. Transformá-los em multiplicadores de informação
qualificada
· Considerar que escalabilidade não é só para startup
· Produzir conteúdo qualificado – pensar na brand
persona, na buyer persona e focar no inbound qualificado de informações
· Começar, no caso do pequeno empreendedor, com ferramentas
simples e analisar o mercado, estudar o consumidor. Qual é o poder de compra
dessa pessoa e o processo de consumo? Aí parar de agir intempestivamente e
pedir ajuda das agências e consultorias de comunicação
Sobre
Júlio César Barbosa
O professor, escritor, poeta,
cantor, doutor em comunicação pela ECA-USP e consultor Júlio César Barbosa tem
quase 30 anos de atuação no mercado de comunicação. Já foi diretor da Secretaria do Meio Ambiente, tem uma banda de jazz, faz
vídeos no Instagram. Como consultor, já desenvolveu
projetos para Alcoa, Unilever, Jonhson&Johnson, Duke Energy, Mattel, Andrade
Gutierrez, Bluestar Silicone, L’Oréal, entre outras. Atua também na capacitação
de professores com foco em criatividade. Siga-o pelo Instagram em
@juliocesarb66
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